O lançamento do livro “Casamento e divórcio na perspectiva civil constitucional” no Teatro Santo Agostinho foi um enorme sucesso.
Os autores, professor Paulo Hermano e professor Edson Fonseca, proferiram palestras e apresentaram a obra para um auditório de aproximadamente 500 pessoas. As obras disponíveis para aquisição esgotaram nos primeiros 30 minutos do evento.
Após as palestras os autores autografaram a obra para um grande grupo de acadêmicos, professores e autoridades.
“Antes de principiar esse livro com as razões que oferecemos para as conclusões que extraímos é imperioso estabelecer, como premissa irrecusável, que a FAMÍLIA deve ter sempre a melhor proteção do Estado e a mais cuidadosa atenção de toda gente, principalmente daqueles que a protagonizam. A banalização da família é falta grave, um plantar de tragédia, e mais, é ignomínia que depõe contra a sociedade que a permite ou estimula. É preciso sempre repetir essas coisas, como um triságio de fé, para que os acertos da cultura não sejam usados em desfavor dela.
É na família que a pessoa nasce, fruto do encontro e da convergência, para encontrar viabilidade para seu corpo e seu espírito. No ambiente familiar são construídos, reproduzidos, ampliados e consolidados, dentro do abraço afetuoso e comprometido dos que se amam, as delicadezas da moral, as sutilezas da ética, a indispensabilidade da convivência pacífica, e a irrecusável higidez da justiça.
Casamento é uma das formas de constituição da família, e esta não é produto da Lei, nem de um pedaço de papel coberto de formalidades e solenidades, mas resultado da necessidade que tem muitos nomes e habitação fixa dentro de nós. Não há lei que crie a FAMÍLIA, nem há lei capaz de dissolvê-la. Somente o afeto, no abstrato e ainda inexplicável plano do espírito, pode fazê-lo. Por isso nosso enunciado primeiro: nenhuma lei pode compelir casais felizes a se divorciar, nem mesmo a Constituição revoga a lei do desejo.
Contudo, historicamente, o legislador tem imiscuído na seara que não lhe pertence, normatizando – de forma dura e intransigente até – o que não é normatizável.
A sociedade brasileira tem a experiência do casamento como exclusivo sinônimo de sacralidade, correção e moral nas relações entre homem e mulher, tanto que, durante um largo período, relacionamentos que não contassem com o selo legitimador do matrimônio formal condenavam seus partícipes à ilegitimidade. Essa pecha contaminava os filhos que deles proviessem, marcando gerações com o estigma da marginalidade. O casamento monopolizava o liame virtuoso, e, as relações fora do casamento se confundiam com o pecado. Este sistema normativo dava a latitude e a longitude de uma cultura tremendamente influenciada pelo Direito Canônico naquele momento histórico.
A sacralidade trazia consigo a mística característica da indissolubilidade do casamento, atributo com sede constitucional, mas de raízes religiosas, que determinava a união vitalícia, independentemente da qualidade de família produzida ou da felicidade de seus protagonistas. As pessoas que, por qualquer razão, assistissem seu casamento ruir no plano fático, jamais poderiam se desligar do outro no plano formal. A indissolubilidade afrontava o amor, porque obrigava as pessoas a permanecerem juntas, não porque se amavam, mas porque a Lei assim o determinava.
A situação jurídica era, no mínimo, extravagante: de um lado não se estava mais casado, porque rompida a sociedade conjugal, mas de outro, ainda se estava casado, porque o vínculo conjugal permanecia íntegro.
O casamento que terminava pelo desquite, continuava a existir até que uma das partes encontrasse o óbito. Essa realidade subsistiu até o final da década de 1970.
Não é difícil perceber o quanto é perversa a separação sem o divórcio. Se a intenção é proteger o casamento, impedindo sua ruptura, a mera separação frustra este desiderato, porque não admite a constituição de duas novas famílias. O divórcio que rompe o vínculo, por sua vez, tem o condão de permitir um segundo casamento, sendo, portanto, singularmente muito mais a favor do casamento que a separação, que apenas rompe a sociedade.
A propósito,Friedrich Engels, nos idos de1884, já sustentava que “se o matrimônio baseado no amor é o único moral, só pode ser moral o matrimônio onde o amor persiste”, e quando o afeto desaparece ou é substituído por um novo amor apaixonado, “o divórcio será um benefício, tanto para ambas as partes como para a sociedade”.
A possibilidade jurídica do rompimento vincular do casamento somente ganhou espaço no ordenamento jurídico brasileiro em 1977, via Emenda Constitucional nº 9 que alterou o parágrafo 1º do art. 175 do texto Constitucional então vigente, admitindo que o casamento pudesse “ser dissolvido, nos casos expressos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de três anos”. No mesmo ano, veio a lume a Lei nº 6.515, de 26/dezembro/1977, alcunhada de Lei do Divórcio, que regulou os casos de dissolução da sociedade e do vínculo conjugal.
Porém, o legislador, de costas para o futuro, continuou aliando a viabilidade da separação à conduta culposa que pudesse ser atribuída a uma das partes, compelindo que o debate envolvendo a intimidade do casal ocorresse no espaço público dos tribunais. Essa circunstância foi alvo de resistência e reiterado combate pela doutrina.
A Constituição Federal de 1988 promoveu uma ampliação nas possibilidades de divórcio em seu art. 226, § 6º, texto reproduzido no artigo 1.580 do Código Civil de 2002. O divórcio, então, poderia ocorrer após prévia separação de fato por mais de dois (2) anos, ou após um (1) ano de separação formalizada. Inobstante, a questão da prova da culpa para as separações litigiosas permaneciam no ordenamento.
A Emenda Constitucional nº 66/2010 (EC 66/2010), ao dar nova redação ao artigo 226, § 6º da CF/88, suprimiu os requisitos do lapso temporal e prévia separação (judicial ou extrajudicial) para o divórcio, o que tornou essa última obsoleta e vazia de fundamento no ordenamento jurídico.
A EC 66/2010 promoveu a facilitação para o fim de casamentos malsucedidos, e essa parece ser sua finalidade mais aguda, e o fez, apenas retirando os obstáculos existentes. Não houve um regramento procedimental novo, apenas o esquecimento do arcaico sistema dual existente. A liberdade das pessoas de se casarem foi ampliada para a liberdade de não permanecerem casadas.
E essa, provavelmente, é a mais contundente razão do divórcio se fazer presente nos ordenamentos jurídicos da maior parte do planeta: as pessoas desde sempre, mas com muito mais vigor nos tempos modernos, estão transtornadas pelo desejo de liberdade. Liberdade de amar e constituir família, e se não der certo uma vez, amar de novo e constituir família de novo.
A tutela constitucional, antes expressa para a separação prévia, passa a contemplar somente a hipótese de divórcio, com reflexos imediatos e inevitáveis sobre as normas hierarquicamente inferiores. A não recepção das normas infraconstitucionais pela nova ordem revoga-as.
A presente obra trata da novidade legislativa, analisando, discutindo e oferecendo soluções para indagações que surgem e para os desafios que a assimilação do novo paradigma apresenta, principalmente quando confrontado com os dogmas que ainda assombram o Direito de Família contemporâneo. Para sua elaboração foi realizada intensa pesquisa na legislação, doutrina, jurisprudência, anais do Congresso e ouvidos os arquivos de áudio referentes aos debates e audiências públicas que precederam a aprovação do Projeto de Emenda Constitucional.
O Capítulo I – Das Famílias – apresenta uma síntese do panorama normativo brasileiro sobre o Direito de Família, sua constitucionalização expressa a partir da Constituição Federal de 1988, mais considerações sobre alguns dos arranjos familiares possíveis na multiplicidade plural do Direito de Família moderno.
O Capítulo II examina o casamento na perspectiva do legislador civil, trazendo noções conceituais, natureza jurídica, pressupostos, características, impedimentos, causas suspensivas, habilitação, celebração, casamentos em situações especiais, invalidade do casamento e questões incidentais.
O Capítulo III examina o casamento entre pessoas do mesmo sexo, com base nas as decisões recentes do Supremo Tribunal Federal ao julgar a ”Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277″ e a “Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132″ recebida como ADI, e inda no voto proferido pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luiz Felipe Salomão, no julgamento do Recurso Especial nº 1.183.378 – RS (2010/0036663-8), onde se alegava ofensa ao art. 1.521 do Código Civil de 2002.
O Capítulo IV trata da face patrimonial do casamento debatendo os regimes de bens disponíveis explícita, e implicitamente, no ordenamento.
O Capítulo V traz uma minuciosa evolução histórica do tema no Brasil desde a Colônia (1500…), passando pelo Império (1822…) até a República (1889…), examinando disposições legais nas Ordenações Filipinas, no período anterior ao codificado, a perspectiva do legislador de 1916, as Constituições até a Emenda Constitucional n. 09/1977. Por fim, a Constituição Federal de 1988 e a tramitação e promulgação da Emenda Constitucional n. 66/2010.
O Capítulo VI examina a Emenda Constitucional 66/2010 na perspectiva do Direito Constitucional, com análise da oportunidade da EC e resumo de sua tramitação.
O Capítulo VII apresenta o tema na perspectiva do Direito Constitucional, examinando a constitucionalização do direito, os direitos fundamentais e sua compreensão horizontal, o direito intertemporal e o reflexo da Emenda Constitucional 66/2010 na legislação infraconstitucional.
O Capítulo VIII trata do novo instituto do Divórcio, mediante a apreensão das consequências produzidas pela EC 66 na doutrina do vínculo e da sociedade conjugal, nos prazos previstos na legislação infraconstitucional, no destino do instituto da separação, no esvaziamento da culpa e questões incidentais.
Por fim, o Capítulo IX examina a novidade na perspectiva da desjudicialização do divórcio.
A pesquisa foi realizada com olhos voltados para a compreensão da modificação ocorrida no plano constitucional e os irresistíveis reflexos na legislação infraconstitucional.”
(extraído do texto de apresentação da obra)